O estudo “Aterrizando na Água: Interdição Aérea, Tráfico de Drogas e Violência na Amazônia Brasileira”, do projeto Amazônia 2030, revela que, entre 2000 e 2019, a taxa de homicídios na região quase dobrou, um aumento alarmante impulsionado pela crescente presença do crime organizado na região.
O município de Tabatinga, por exemplo, está situado em um local estratégico para o tráfico internacional de drogas, na região da tríplice fronteira (Brasil-Colômbia-Peru). Autoridades brasileiras destacam que 70% das drogas ilícitas que entram pela Amazônia passam pela cidade amazonense.
A partir do momento em que essas drogas entram no país, o desafio das forças de segurança é combater a atividade ilegal e proteger a comunidade ribeirinha, que fica exposta à violência.
“Como o estado do Amazonas é composto por inúmeras vias fluviais, uma vez que a navegação é o principal meio de deslocamento do amazonense para outras cidades do nosso estado, os rios são as ‘estradas’ que ligam os municípios. Logo, são o meio de maior acesso para que o tráfico de drogas se perpetue entre as cidades do interior do estado, com o transporte de substâncias entorpecentes, principalmente pela ausência de fiscalização”, comentou a especialista em Segurança Pública, Goreth Rubim.
Bruno e Dom

Sem fiscalização adequada, o crime organizado aproveita para se infiltrar na vida das comunidades, gerando sentimento de medo e invisibilidade. Isso ocorre porque, devido ao isolamento geográfico causado pelos rios da Amazônia, nem sempre a polícia chegará rapidamente para resolver uma situação, se for chamada.
Um dos casos mais notórios que expõem a violência no interior do Amazonas é o duplo assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, ocorrido em 2022, próximo ao Vale do Javari.
As mortes, segundo investigação da Polícia Federal, ocorreram após o traficante Rubens Villar Coelho, conhecido como “Colômbia”, ordenar e patrocinar o duplo assassinato como retaliação às denúncias ligadas aos crimes ambientais cometidos na região.
A Polícia Federal concluiu que “Colômbia” usava a venda de peixes e animais capturados pela quadrilha para lavar dinheiro do tráfico de drogas. Assim, as substâncias eram produzidas no Peru e na Colômbia e vendidas a facções criminosas brasileiras.
Os corpos de Bruno e Dom apresentavam sinais de queimaduras, desmembramento e tiros.
Rotas fluviais

As rotas fluviais tornaram-se indispensáveis para a atividade do tráfico de drogas após a implementação da política de interdição aérea em 2004, que teve como efeito imediato a redução do uso de rotas aéreas para o tráfico de cocaína.
O estudo do projeto Amazônia 2030 traçou os 16 rios que formam potenciais rotas de tráfico de cocaína. Esses rios conectam os países andinos ao Rio Amazonas e à cidade de Manaus. São eles: Abuna, Acre, Amazonas, Caquetá, Envira, Içá, Japurá, Javari, Juruá, Madeira, Mamoré, Negro, Purus, Tarauacá, Uaupés e Xiê.
A partir deste panorama, podemos analisar a influência da expansão do tráfico de drogas na região e seus impactos nas comunidades ribeirinhas. Com a restrição do espaço aéreo, os rios passaram a ser a principal rota para o tráfico de drogas, aumentando a violência por onde passam.

Segundo a análise, os resultados indicam que aproximadamente 1.430 homicídios registrados entre 2005 e 2020 podem ser atribuídos ao deslocamento do tráfico de cocaína causado pela política de interdição aérea. Isso representa 27% do total de homicídios em municípios situados em rotas fluviais durante o mesmo período.
Entre as principais vítimas estão homens com idades entre 20 e 49 anos, mas também houve um aumento nos homicídios de adolescentes e jovens adultos, que são aliciados pelo tráfico.
Combate ao crime organizado

Para combater esse tipo de atividade, não basta apenas investir no reforço da segurança, como explica Goreth Rubim.
“O principal mecanismo de combate ao crime organizado é o desenvolvimento de políticas públicas sociais voltadas à educação de qualidade e oportunidades de emprego para as pessoas que moram nas cidades e comunidades ribeirinhas do interior do estado do Amazonas, pois onde o Estado não se faz presente, o crime organizado ganha espaço para expandir suas atividades ilegais. Consequentemente, não adianta criar inúmeras políticas públicas voltadas à Segurança Pública, se o problema não for tratado em sua origem”, disse.
No intuito de restringir ainda mais a atuação ilegal no estado, o Governo do Amazonas entregou, em janeiro, mais de R$ 7 milhões em equipamentos para as forças de segurança do estado. O pacote inclui 320 fuzis para as polícias Civil e Militar, 300 computadores e munições.
O Governador Wilson Lima também inaugurou a nova sede da Secretaria de Segurança Pública, que vai reunir 250 profissionais, contando com um porto próprio para atracação de embarcações. Esses investimentos fazem parte do programa Amazonas Mais Seguro, que, desde 2019, já destinou mais de R$ 1 bilhão e 160 milhões para o setor.
Somente em 2024, as ações de segurança resultaram em recordes de apreensão, com mais de 43 toneladas de drogas, representando 70% do total apreendido em toda a Região Norte.
Rosana Ramos – emtempo